Porque acha que ainda agora se está a dar os primeiros passos na
psicologia desportiva?
Não se
estão a dar os primeiros passos na Psicologia Desportiva. Acontece sim que
agora talvez se oiça um pouco mais. Em Portugal é uma realidade presente no
futebol já há uns anos. Neste momento, felizmente, abrange já bastantes
desportos como hóquei, natação, triatlo, atletismo entre outros. Lá fora a
realidade é outra, há psicólogos desportivos a trabalharem com um gabinete
aberto em que atletas de qualquer modalidade podem ir. Em Espanha por exemplo
uma equipa de ciclismo já teve um psicólogo do desporto a trabalhar. Creio que
é uma realidade que (quase) todos os intervenientes no desporto consideram como
tendo papel fundamental. Hoje em dia é verdade que se houve falar mais nesta
área, mas vai continuar ainda mais uns anos a ser considerado algo de segundo
plano dada a conjuntura económica que estamos a passar no país, o que faz com
que as equipas trabalhem de facto com o que consideram essencial, viveram
tantos anos sem um psicólogo então não sentem a falta desta vertente. Quem
trabalha com um psicólogo percebe que o trabalho desenvolvido é importante, e
quando prescinde dele sente a sua falta, quem nunca trabalhou obviamente não
sente e então só nos procura em caso de necessidade.
Sente que há algum estigma associado ao seu trabalho?
Ainda
existe, cada vez menos é verdade, mas existe. Os atletas no geral associam a
necessidade de ter um psicólogo desportivo a problema “mentais”, o que não
corresponde de todo à realidade. Ouvi expressões como “não estou maluco”, “eu
não tenho nenhum problema”… O trabalho que se faz (no desporto) está
relacionado com a otimização do rendimento, fazer com que o atleta renda o
máximo possível. Mas logicamente muitos dos intervenientes no desporto
consideram o nosso trabalho fútil e desnecessário. Mas através da minha experiência profissional aprendi que cabe a mim explicar a minha função e
“provar” que é de facto importante, que o psicológico tem um peso importante no
rendimento. Creio que é esta a fase da psicologia do desporto, temos de criar a
nossa necessidade. E a melhor forma de acabar com estigmas é a ideia que quem
trabalha connosco fica e a publicidade que faz depois do nosso trabalho.
Como é que é feito o trabalho psicológico numa equipa de alta
competição?
A
psicologia do desporto é muito vasta. O trabalho pode ser feito unicamente com
o treinador/director desportivo, ajudando-o a ser melhor líder, a trabalhar a
sua comunicação, a saber trabalhar o grupo, etc. Podemos trabalhar também com a
equipa fazendo otimização de rendimento como já referi anteriormente,
trabalhando motivação, concentração, coesão de grupo, comunicação, relaxamento,
paragem d pensamentos negativos, visualização mental entre outras coisas
através de técnicas, pode ser feito no terreno e/ou em gabinete. Podemos
trabalhar também individualmente, um ciclista pode achar que gostaria de
melhorar alguns pontos e procura um psicólogo e faz se um trabalho isolado.
Creio que seja importante referir que é um trabalho q tem total sigilo profissional
em relação ao atleta com que trabalhamos.
Falando
um pouco da minha ultima experiência, estive numa equipa de futebol
profissional em que acompanhava de perto a equipa, todos os treinos, todos os
jogos, em que trabalhei com os treinadores e com todos os jogadores em gabinete
e em terreno e que foi um trabalho que correu bastante bem pois posso assegurar
que todos os jogadores melhoraram o seu rendimento, uns mais que outros uma vez
que é necessário trabalhar e quanto mais a serio se levar melhor corre. Não há
milagres, costumo dar este exemplo um quando vamos ao medico ele passa a
medicação a pessoa que curar se toma a medicação, neste caso é o mesmo, eu
“receito o medicamento” e o atleta “toma” (pratica), depende da
disponibilidade, é necessário treino mental, o mesmo se passa em relação ao
treino físico, ele é estipulado e tem de ser feito para se melhorar.
É possível evoluir psicologicamente?
Obviamente.
E é esse o meu trabalho, ajudar o atleta a melhorar e assim evoluir.
Inicialmente percebemos os pontos menos bons do atleta, ou através de uma
entrevista e/ou da aplicação de um teste geral com todos os parâmetros
psicológicos possíveis de serem trabalhados e depois há que trabalhar para os melhorar.
Acha
que isso fará a diferença no resultado final?
Toda. Nada substitui o
trabalho físico. Mas um atleta pode estar lindamente fisicamente mas de a
“cabeça” não está focada no que está a fazer, se não se consegue concentrar, se
por uma razão qualquer não está motivado, por exemplo, o atleta não vai render
o que poderia, rende mas poderia render muito mais. O contrário logicamente que
também se aplica, um atleta pode ser o melhor psicologicamente mas se não
treinar de nada lhe serve. Creio que o psicológico é sem duvida o que faz a
diferença entre os atletas, porque dentro da alta competição todos tem bons
planos de treino adaptados, todos tem bom material para treinar, todos tem uma
serie de coisas comuns e que lhes estão perfeitamente disponíveis, então neste
caso o que vai fazer com que se seja um pouco melhor que alguém que tem todas
as mesmas condições físicas será o factor psicológico.
Desde
que escalão pensa que se deve aplicar a psicologia?
Em qualquer escalão
pode ser aplicada. Desde o desporto de formação até ao desporto profissional. È
uma área vasta, podemos trabalhar em desporto escolar, desporto de iniciação,
desporto de recreação e lazer, desporto profissional, desporto veterano em
qualquer área. Logicamente que com intervenções diferentes. Até aqui tenho
falado das intervenções com profissionais, porque considerei mais pertinente,
mas no desporto de iniciação por exemplo podemos trabalhar questões de
desenvolvimento motor e social das crianças. O trabalho que desenvolvo
actualmente é com crianças/adolescentes e passa pela reinserção social através
do desporto, são crianças problemáticas, de bairros sociais que necessitam de
ajuda para poderem crescer saudáveis e inserirem se numa sociedade com regras,
regras essas que elas não tem em casa dadas as suas condições económicas e
familiares.
Pensa
que num futuro próximo a sua profissão será mais requisitada?
De
certeza. È necessário que a conjuntura económica do país mude, porque se não
fosse essa questão creio que estariam mais equipas a trabalhar com psicólogos
desportivos. Porque sou abordada frequentemente com questões como “queria
melhorar isto é possível?”, mas depois o serviço tem de ser pago do bolso do
próprio atleta neste caso e muitas vezes ele já não está a ganhar tanto como
gostaria e então não investe. Penso que tal como há uns anos na equipa não era
necessário médico fixo hoje em dia não se prescinde disso, tal como já é
prática normal um fisioterapeuta, massagista, nutricionista. Creio que seja
também importante referir que psicólogos desportivos de base, não me refiro aos
que provem da psicologia clínica e tiram uma especialização na área, mas sim
aos quem tem toda a licenciatura em psicologia desportiva apenas se formam á
cerca de 8, 9 anos. É uma área com muito caminho por explorar ainda.
Ana à esquerda com Sérgio Sousa e Carlos Pereira à sua direita. |
Sr. Carlos Pereira sei
que conhece a Ana Saraiva, qual a sua opinião à cerca dela?
Tenho uma boa impressão
da Ana Saraiva, parece me bastante empenhada e profissional, acompanhou a
ultima etapa da volta a Portugal deste ano no meu carro de equipa.
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